Luiz Sayão (*)
O panorama
religioso brasileiro mudou radicalmente. A religião dominante perdeu espaço,
minorias como os sem-religião, espíritas e evangélicos têm crescido no Brasil.
Os pentecostais e neopentecostais cresceram de modo surpreendente. Os herdeiros
da Reforma Protestante, os evangélicos, eram cerca de 13% da população em 1991,
chegaram a 22% em 2010 e atingem 32% hoje (Datafolha). São mais de 60 milhões
de pessoas.
A Reforma, que
mudou a história da Europa, foi um retorno à Bíblia. Sola Scriptura foi
o grito de Lutero, acompanhado por Calvino, Zuínglio e muitos outros. As
mudanças socioculturais, econômicas e teológicas decorrentes do Protestantismo
reescreveram a trajetória de diversos povos e lhes deu nova identidade.
Os contornos teológicos do fim da Idade Média exigiam uma releitura da
cristandade europeia a partir de suas origens. Os reformadores, luteranos,
anglicanos, calvinistas e anabatistas, esboçaram uma caminhada em direção ao
cristianismo primitivo, à busca da exegese bíblica, à compreensão da graça
divina e da salvação, à liberdade de consciência.
O primeiro culto
protestante das Américas aconteceu no Rio de Janeiro (1557). Com a Constituição
de 1824 e a entrada de imigrantes alemães e suíços, luteranos e reformados
chegaram ao país. Mas, só tiveram influência decisiva na formação religiosa dos
imigrantes e seus descendentes. Paralelamente, os ingleses que aqui viviam
tiveram liberdade de praticarem o anglicanismo. O protestantismo missionário
chegou mais tarde: congregacionais (1855), presbiterianos (1859), metodistas
(1867) e batistas (1871).
Tradicionalmente
agentes da modernidade e secularização, nossos protestantes não se alinharam
com a cultura brasileira. Com herança puritana, espiritualidade petista e
ênfase no indivíduo, a nova fé via a tradição católica como atraso e pobreza. A
fé protestante valorizava o trabalho, a repressão das paixões, a
intelectualidade produtiva e a tranquilidade econômica da posteridade. As
características desse protestantismo missionário podem ser assim resumidas:
Doutrinária. Ênfase na autoridade da Bíblia em oposição à tradição, crença na
salvação individual pela graça e pela fé e não em obras e sacramentos,
intermediação única de Cristo entre Deus e o homem em oposição à intercessão de
Maria, dos santos etc.
Culto. Abolição de ícones no culto, centralidade da pregação, valorização da
atuação dos leigos, proselitismo (conversão), negação do mundo e repressão das
paixões (santificação), maior participação dos membros no culto.
A enorme extensão
do país e a falta de sacerdotes romanos marcaram a dificuldade católica de
cuidar de seus fiéis, membros de uma fé diversificada. Como notou Gilberto
Freyre, os portugueses tinham uma divisão de personalidade, acostumados com
diferenças raciais e religiosas que marcaram sua história. No caso do Brasil
caboclo e mulato, a flexibilidade e convivência com a contradição se tornaram
uma realidade. As ideias liberais e positivistas, aliadas à influência
maçônica, presentes na elite permitiram maior liberdade religiosa no país. Assim,
os protestantes começaram a evangelização para converter os católicos à nova
fé. Distribuindo Bíblias, realizando cultos vivos, usando leigos nas pregações,
nas escolas dominicais e numa estrutura de igreja marcada pela ampla
participação dos fiéis, os protestantes iniciaram com sucesso sua empreitada no
país.
A tropicalização
desse protestantismo é uma experiência única. Trata-se de uma igreja muito
recente, em busca de sua identidade e caminho. Em parte, é uma expressão de
progresso e desenvolvimento social, em parte é retrógrada e obscurantista. Seu
perfil mais popular se afasta de suas raízes e mostra-se cheio de misticismo,
marcados por experiências existenciais e espirituais frágeis e pré-modernas. O
que será do Protestantismo Brasileiro, o movimento evangélico? Se não é fácil
entender nosso Brasil, mais difícil será compreender nossa igreja evangélica.
Qualquer previsão sobre o futuro é temerária. Que Deus nos ajude e nos abençoe.
(*) Luiz
Sayão é pastor, teólogo e hebraísta da Igreja Batista Nações Unidas
(São Paulo-SP)
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